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Livro-brinquedo apela cada vez mais à emoção

A literatura infantil está a viver uma fase dourada, elevando o leitor a coautor e afirmando-se por vezes como “obra de arte” entre a concorrência feroz de suportes visuais e digitais. Quem o diz é Diana Martins, do Centro de Investigação em Estudos da Criança da Universidade do Minho e autora da primeira tese de doutoramento sobre o livro-brinquedo em Portugal.

 
livro

Diana Martins analisou mais de 300 livros-objeto em português e comparou com a realidade internacional. “As editoras apelam à emocionalização do livro, tal como nos ecrãs”, define. “Nesta sociedade hipermoderna e acelerada, o divertimento e o conhecimento tendem para objetos com forte poder de atração, o que não é mau por si, desde que esses objetos sejam criativos, complementares e ampliem a experiência, isto é, que a forma não supere o conteúdo, que não se limite a uma espetacularização e a uma instrumentalização visual”, acentua.

 
 

 
No seu doutoramento em Estudos da Criança pela UMinho, Diana Martins verificou que a oferta mais comum do livro-objeto é em puzzle ou com uma peça destacada, “sugerindo a exploração cúmplice entre o mediador/adulto e a criança”. Nesses momentos aborda-se amiúde o faz-de-conta, a magia das horas, as profissões ou o jogar com a vacina e o martelo. Nos livros híbridos, “perfil pós-modernista que veio para ficar”, combina-se rosto, olhos e boca em figuras fictícias, por exemplo. “Essa componente lúdica, interativa e humorística é essencial numa fase em que a criança está a aprender a saber ser e saber fazer: explora o simbólico, a fantasia e o conta outra vez”, declara. Isso sucede também nos livros com sons de animais e pequenas melodias ou nos tradicionais livros poético-líricos de rimas e trava-línguas. “Há vários caminhos na leitura e os objetos visuais, sensoriamente sedutores, ajudam na mentalidade mágica dos mais novos e na sua apropriação mais palpável do ‘real’”, considera.

Múltiplos formatos e públicos

 
 

 
A mediação latente, o apelo ao toque, o recetor além da criança, o designer narrador e o sem-fim de formatos formativos e lúdicos mostram como o livro infantil se reinventa. O segredo está sobretudo na parte física do livro e no design, que arrisca áreas como embalagens, teatro ou materiais para certas idades, como relevos e janelinhas para um uso autónomo. “Perante uma sociedade com imensa oferta cultural e os imperativos de renovação, criatividade e experiência, estes artefactos procuram ser provocadores”, frisa Diana Martins. A sobrevivência do livro para a infância em geral, como alguns estudiosos e criadores têm afirmado, “passa por ser considerado objeto de culto ou obra de arte”, anui. Aliás, o cariz comercial acentuado daquele produto capta o adulto (o verdadeiro comprador) e ativa no leitor uma exploração material e gráfica única, sustenta.

 
No seu estudo, Diana Martins concretizou várias tipologias de livros-objeto, um vasto universo editorial de definição desafiante. Em concreto, os sistemas planos (com efeitos de movimento e transformação de imagem, como discos giratórios), os sistemas tridimensionais (pop-ups, livros cenário/teatro), a encadernação atípica (livros acordeão/carrossel, com rodinhas, em boneco articulado e tiras mix & match), a adição de materiais incomuns (desde plástico, pano, pegas para praia/banho/barquinho e focando rotinas diárias), os efeitos de ótica (simular o galope, mimetizar o frenesim) e os livros híbridos (mecanismos bi e tridimensionais, cruzando técnicas).

 

 
Natural de Paços de Ferreira, a autora é licenciada em Design de Comunicação, mestre em Ilustração e doutorada em Estudos da Criança – ramo Literatura para a Infância. Leciona no Instituto Politécnico do Cávado e Ave, dá formações na sua área científica, tem diversos artigos publicados e é ilustradora.

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